Financiamento Climático e a Necessidade de Coordenação Estatal

Por Douglas Alencar (UFPA)

A economia pós-keynesiana se baseia em uma série de princípios que norteiam os estudos dessa escola de pensamento. Um dos pilares dessa perspectiva é a concepção de uma economia monetária de produção, na qual as firmas desempenham um papel central na determinação dos níveis de produção, emprego e poupança.

O princípio da produção estabelece que as firmas buscam maximizar seus lucros, definidos em termos monetários, e não simplesmente a alocação eficiente de recursos como postulado pelo pensamento ortodoxo. Esse comportamento empresarial é reforçado pelo princípio da estratégia dominante, segundo o qual há uma assimetria fundamental entre os agentes econômicos: são as firmas que tomam as decisões fundamentais sobre produção e investimento, e não os consumidores ou poupadores.

A temporalidade dos processos econômicos também é um elemento crucial da abordagem pós-keynesiana. Como a produção ocorre ao longo do tempo, as firmas precisam formar expectativas sobre a demanda futura, o que introduz incerteza no processo de tomada de decisão. Essa incerteza é exacerbada pela não ergodicidade dos processos econômicos: o futuro é radicalmente incerto, e os agentes não podem inferir distribuições de probabilidade a partir de dados passados.

Outro princípio essencial é o da coordenação, que enfatiza a ausência de um mecanismo de planejamento central na economia capitalista. Os planos dos agentes não são previamente coordenados, o que pode resultar em desequilíbrios e instabilidade macroeconômica. A moeda também possui um papel fundamental, sendo definida por suas propriedades específicas, como elasticidades de produção e substituição nulas ou negligenciáveis, garantindo sua viabilidade como meio de contrato e liquidação de obrigações.

Diante desse arcabouço teórico, a questão climática representa um desafio significativo. A crença de que os mercados, sem coordenação, podem solucionar o problema ambiental ignora aspectos essenciais da economia capitalista. As firmas têm incentivos para maximizar seus lucros no curto prazo, o que frequentemente resulta em uma exploração insustentável dos recursos naturais. Além disso, a incerteza inerente ao sistema econômico e a não ergodicidade dificultam o desenvolvimento de expectativas fundamentadas sobre os impactos ambientais futuros.

A transição para uma economia de baixo carbono exige investimentos substanciais em infraestrutura verde, tecnologia limpa e adaptação climática. Contudo, o princípio da coordenação nos alerta que não há um mecanismo espontâneo que garanta que esses investimentos ocorrerão na escala e velocidade necessárias. Além disso, as propriedades da moeda e do sistema financeiro limitam a capacidade do setor privado de financiar tais investimentos sem um apoio estruturado.

Diante desse cenário, a intervenção estatal se faz indispensável. O financiamento climático não pode depender exclusivamente das decisões individuais das firmas, pois a racionalidade privada frequentemente entra em conflito com as necessidades públicas de sustentação ambiental e estabilidade macroeconômica. Políticas públicas devem garantir a alocação de recursos para setores estratégicos, oferecendo mecanismos de financiamento de longo prazo, subsídios e regulações adequadas para induzir a transição para uma economia sustentável.

Portanto, à luz dos princípios pós-keynesianos, é evidente que a solução para a crise climática requer a presença ativa do Estado na coordenação dos investimentos e no financiamento da transição para uma economia verde. A fé irrestrita na capacidade de autoregulação dos mercados ignora os limites estruturais do capitalismo e a urgência de enfrentar os desafios ambientais de forma planejada e coordenada.

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