Financiamento climático no Brasil de 2011 a 2023

Por Douglas Alencar (UFPA)

O acesso a dados públicos sobre os acordos firmados nas Conferências das Partes (COPs) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) é fundamental para a compreensão dos esforços globais de combate às alterações climáticas. Dentro desse escopo, o financiamento climático emerge como um pilar central das COPs, com nações desenvolvidas comprometendo-se a alocar recursos para auxiliar países em desenvolvimento a enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas. Esses recursos são direcionados tanto para ações de mitigação, focadas na redução de emissões de gases de efeito estufa, quanto para iniciativas de adaptação, que visam o ajuste às consequências já perceptíveis das alterações climáticas. Adicionalmente, a categoria “transversal” abrange ações que beneficiam de forma integrada tanto a mitigação quanto a adaptação, ou que oferecem suporte mais abrangente à agenda climática.

Nesse cenário global de enfrentamento das mudanças climáticas, o financiamento climático desempenha um papel crucial, exigindo esforços contínuos e investimentos vultosos. As COPs funcionam como a plataforma principal para o diálogo, a definição de metas e o estabelecimento de mecanismos para o repasse desses recursos. No contexto brasileiro, a análise detalhada dos investimentos em mitigação, adaptação e projetos transversais entre 2011 e 2023 oferece uma perspectiva clara da dinâmica desses fluxos financeiros. Os dados revelam uma notável variação nos montantes e flutuações entre as categorias de investimento, refletindo diretamente as prioridades e os desafios inerentes à implementação da agenda climática no país.

Repasses para o Financiamento Climático

Fonte: UNFCCC[1] e BID[2].

O gráfico de colunas exibe os “Repasses para o Financiamento Climático” anualmente de 2011 a 2023. O ano de 2012 se destaca com o maior volume de repasses, atingindo cerca de R$ 1.550 milhões. Após esse pico, houve uma queda significativa em 2014, com o menor valor registrado, aproximadamente R$ 150 milhões. Nos anos subsequentes, os repasses demonstraram flutuações, com valores consideráveis em 2013, 2015 e 2017, e uma recuperação notável em 2023, que registrou o segundo maior volume de repasses no período, aproximando-se de R$ 950 milhões. De modo geral, o gráfico ilustra a variação nos investimentos para o financiamento climático ao longo dos treze anos apresentados.

Repasses para o Financiamento Climático para mitigação, adaptação e transversal

Fonte: UNFCCC e BID.

O gráfico apresenta a evolução anual de investimentos, categorizados em “mitigação” (azul), “adaptação” (vermelho) e “transversal” (verde), no período de 2011 a 2023. Observa-se que, em 2012, houve um pico significativo de investimentos, predominantemente na categoria “transversal”, atingindo cerca de R$ 1.500 milhões. Após esse ano, os valores flutuaram, com destaque para 2015, onde a categoria “mitigação” teve um aumento notável, e 2023, que mostra um crescimento geral, com a categoria “adaptação” atingindo seu maior valor no período, contribuindo para um investimento total próximo a R$ 900 milhões. As categorias “mitigação” e “adaptação” demonstram variabilidade ao longo dos anos, enquanto a categoria “transversal” apresenta os maiores montantes em diversos anos, mas também oscila consideravelmente.

O panorama dos investimentos em financiamento climático no Brasil, analisado até 2023, revela uma distribuição de recursos que merece atenção e reflexão. Evidencia-se que, até o ano de 2014, a maior parcela dos investimentos foi direcionada para a categoria “transversal”, indicando uma preferência por ações de caráter mais abrangente ou que se enquadravam em múltiplas finalidades. Contudo, a partir desse período, uma mudança significativa de prioridade se tornou perceptível: os recursos destinados à mitigação, focados na redução das emissões de gases de efeito estufa, ganharam proeminência, assumindo uma fatia mais expressiva do orçamento.

Paralelamente a essa reorientação, observa-se que os investimentos voltados para a adaptação – essenciais para preparar o país e suas comunidades para os impactos já em curso e futuros das mudanças climáticas – permaneceram consistentemente como o menor volume desde o início da série histórica analisada. Essa alocação de recursos levanta um questionamento crucial, especialmente diante do cenário climático atual. Com o aumento substancial e a intensificação de eventos climáticos extremos, como as recentes enchentes devastadoras em diversas cidades e as prolongadas secas em outras regiões, a fragilidade de infraestruturas e a vulnerabilidade das populações tornam-se inegáveis.

Nesse contexto de crescente adversidade climática, surge a imperiosa necessidade de reavaliar a estratégia de financiamento. Seria pertinente considerar um incremento substancial nos recursos alocados para a adaptação. Tal medida não apenas alinharia os investimentos com a urgência dos desafios impostos pelas ocorrências climáticas extremas, mas também fortalecerá a resiliência do país, protegendo vidas, meios de subsistência e ecossistemas. Em suma, o desequilíbrio atual na distribuição dos fundos, com a adaptação em patamares mais baixos, aponta para uma lacuna estratégica que, se não corrigida, poderá agravar as consequências das mudanças climáticas no território brasileiro.

De maneira geral, a análise dos repasses para o financiamento climático no Brasil entre 2011 e 2023, conforme ilustrado pelos gráficos, evidencia um cenário de investimento variável, porém em recuperação. O pico de 2012 e a subsequente queda em 2014 demonstram a sensibilidade desses fluxos a fatores conjunturais. Contudo, a retomada observada em 2023, impulsionada em grande parte pelo aumento dos investimentos em adaptação, sinaliza uma crescente priorização das ações climáticas. A dinâmica entre mitigação, adaptação e projetos transversais reflete a complexidade da agenda ambiental e a necessidade de um planejamento financeiro contínuo e robusto para o enfrentamento dos desafios impostos pelas mudanças climáticas no país.


[1] Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas.

[2] Banco Interamericano de Desenvolvimento.

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